EGO

"Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes
que aqui caleidoscopicamente registro."

(Clarice Lispector)

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

sobre o demônio...


O demônio ansiava pelo nascimento de seu filho. Esperava o momento de rebentar o choro da criança para que Nina se tornasse definitivamente uma aberração.
Lembrou-se da primeira vez que seus olhos pousaram na pequena Nina. A humanidade conferia-lhe uma doçura incomparável, capaz de deixar de joelhos o mais valente dos mortais, o mais sublime dos deuses, o mais abominável dos demônios. Não, não podia sucumbir à beleza etérea da mulher que carregava no sangue a maldição da humanidade. Precisava desviar os pensamentos da alvura da pele, da graça amável das formas, da brandura das coxas que tomou à força. Sentia queimar um fogo desigual dentro do peito.
Não era apenas o velho desejo mórbido que o consumia. E pela primeira vez a besta sentiu medo. A paixão era a maior das ruínas, a mais infame das maldições. Até mesmo para o próprio demônio. Até mesmo nos cantos mais escuros do inferno.


Um comentário:

E Agora José? disse...

Seja em verso, seja em prosa, poesia, lirismo, é o que não falta. A mulher que assombra o dêmonio.