EGO

"Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes
que aqui caleidoscopicamente registro."

(Clarice Lispector)

domingo, 4 de setembro de 2022

primavera

Os ares dos primeiros dias de setembro prometem cantos e floresceres no topo das copas. 
Sinais de vida e manhãs ensolaradas e azuis que não apagam, de longe, a gravidade do frio que passou. 

Um longo inverno, 
um longo inferno. 
Pés e mãos enrigecidos da sombra que pairou e perdura; 
lábios rachados de fome, 
saudade ou secura. 
Há um vidrar de olhos no horizonte sem nuvens que aguardamos. 

Álcool, 
Sex Pistols, 
cortinas de fumaça, 
horas perdidas, 
colchão, 
cigarros, 
avenidas. 

Pétalas amassadas na calçada da procissão que ainda não começou. 
Tarde multicor salpicando a acidez do dia mais longo. A língua larga e quente vibrando a pornografia dos quereres aflitos e afetuosos das mentes confusas e brilhantes. 

Alerta vermelho, 
azul, 
sinal verde pra nós. 
Uma porta, duas chaves. 
Um poema-presente.
Nossa primavera.