EGO

"Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes
que aqui caleidoscopicamente registro."

(Clarice Lispector)

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

todo dia o fim do mundo

todo dia acaba o mundo
no cerrar dos meus olhos
em uma página amarela do tempo
em um suspiro de amor ou cansaço
mas a madrugada fecunda verde,
embrionária, pedra maciça,
estalo de vida acesa e salgada
desatino espiralado de doçura
dulcíssimo tempo
nascente na manhã vitral
poente no esquecimento do dia morto.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

do Reino dos Sonhos

Lá naquela curva depois do fim da Terra havia um reino: o "Reino dos Sonhos", dizia o rei-criança. Era um lugar de sorrisos e calmaria, um lugar onde a paz se instalou para nunca mais fugir. E também era sabido que naquele reino todos os males tinham cura, porque o rei possuía grandes poderes mágicos que afastavam monstros, medos e afins. Até as criaturas que se escondiam nas gavetas, embaixo das camas e dentro dos armários conheciam o domínio do rei sobre a arte da cura da alma. Mas o rei-criança - repleto de sorrisos e bufonarias - não sabia que seus poderes não eram infalíveis (exatamente porque era um rei-criança). E como toda criança - mesmo sendo rei e tendo super poderes - não podia saber todos os segredos do mundo. E foi assim que descobriu, em um dia como outro qualquer, que algo andava diferente. Sentia uma força estranha rondar seu reino, mas contava com seus poderes para afastar de lá todo mal que houvesse. Mas a desordem não era visível, o inimigo não tinha forma. E o rei se entristeceu por não conseguir enxergar o que havia de errado e por não saber como derrotar aquele dragão feito de ar e agonias. Sentou-se em seu trono. Meditou. Seus poderes mágicos pareciam não funcionar naquele momento. Sua agonia começou a consumir seu coraçãozinho de tal forma, que acreditou não poder mais ser rei daquele lugar mágico. Pensou em partir. Talvez precisasse enfrentar dragões que cuspissem fogo e ganhar cicatrizes e levantar outros reinos para que pudesse recobrar a força que achou que tivesse perdido. E chorou. E respirou com pesar. E quando olhava seu reino, já montado em seu ornitorrinco e prestes a partir, veio a pequena moça de olhos vermelhos e puxou a ponta de seu manto, estendendo-lhe uma pequena caixa e um bilhete em cartão negro. E abrindo a pequena caixa cuidadosamente ornada com uma fita dourada, encontrou um doce amarelo e reluzente como o sol que brilhava no céu. Sem entender, fitou novamente os olhos vermelhos da moça e abriu o envelope com o bilhete, que dizia: 

"Feito de um raio de sol roubado. Para te trazer o brilho de volta. Para você reluzir por dentro novamente. Para clarear sua alma de rei e te fazer reencontrar a força. Este doce tem poderes mágicos. Assim como você. Você é tudo que acredita ser."

E o rei abocanhou o doce feito de de raio de sol e instantaneamente sentiu sua força se reintegrando ao seu espírito, como se realmente tivesse poderes mágicos. E por fim entendeu que bastava apenas acreditar. No mundo. Nos doces mágicos. Em si mesmo.

... E o rei-criança continuou a reinar no Reino dos Sonhos, pelo tempo que quis continuar sonhando...

Para meu rei-criança.