EGO

"Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes
que aqui caleidoscopicamente registro."

(Clarice Lispector)

sábado, 28 de fevereiro de 2009

sobre a memória doente...


Há um arquivo aqui dentro, em algum lugar. Sei que há. Mas as informações estão todas tão truncadas, tão bagunçadamente dispostas. Teria alguém mutilado uma parte de mim? Está faltando algo, eu sei. Mas... o quê?

Há lembranças que se ligam com outras lembranças e desencadeiam uma série de outras lembranças. E a memória - esse verbete que tanto me intriga - por vezes se assemelha a borrões coloridos com os quais me deparo e pergunto: o que é isso?

Sinto como se tivesse exilado involuntariamente algumas recordações por tempo indeterminado. Coisas, pessoas, acontecimentos, confidências: algum rastro de sua existência é deixado em mim. Vejo as pequenas gavetas escancaradas e vazias, algo meio remexido. Alguém esteve aqui. Sei das minhas coisas; conheço minhas coisas. Ou teria sido eu mesma?

Lembro do dia em que troquei confidências com alguém. Contei meu segredo. Ele me confiou o que o consumia há tempos. Lembro sobre o que era mas não lembro o que era. Lembro quando, há quase um ano, confessei que não conseguia me lembrar. Lembro da mágoa que ficou entre nós. Lembro de todas as consequências do meu esquecimento. Mas não me lembro o que era.

Preciso catalogar tudo. Porque está tudo aqui e há pessoas, coisas, acontecimentos e lugares que não quero esquecer.

Está tudo aqui, eu sei. Só não consigo me lembrar.
Ainda espero um grande clarão de lucidez que me desperte da loucura.


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