EGO

"Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes
que aqui caleidoscopicamente registro."

(Clarice Lispector)

terça-feira, 30 de abril de 2013

dos silêncios compartilhados em lugares públicos

Descobri no meio dessa minha bagunça errante o teu silêncio. Foi mais silêncio que tudo, confesso. Porque eu não precisava que me dissesse muita coisa ou que me fizesse falar. E os nossos silêncios se encontraram na mesa do almoço, enquanto eu tentava engolir a comida que nem tinha gosto. E eu me sentia um pouco fria, um pouco morta. E vestia aquela saia estampada que você tanto gosta. E me lembro que não conseguia te olhar, que falava baixo olhando a comida que não me apetecia tentando conter o choro. Sentia uma aspereza estranha por dentro. Conseguia ouvir melhor a conversa das outras mesas do que a minha própria voz. Não sei de fato se você conseguia entender tudo o que eu falava - que foi bem pouco, na verdade - mas o fato é que você estava lá. Não me analisou. Não tentou salvar minha vida. Não me prometeu uma cura milagrosa pr'aquela dor estranha. Simplesmente estava lá e nem queria ser notado. Dava meios sorrisos toda vez que meus olhos se levantavam em sua direção. Eu pensava, honestamente, que estava tão fodida da cabeça que talvez você não conseguisse achar muito sentido no que eu dizia, porque eu parecia sem sentido até pra mim. Eu precisava exatamente de um silêncio compartilhado de cumplicidade velada. Fez sentido - tudo fez sentido. E te amei ali, na calmaria no meio da multidão.

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