EGO

"Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes
que aqui caleidoscopicamente registro."

(Clarice Lispector)

quinta-feira, 24 de abril de 2008

sete dias...

Um pouco de sangue no lugar errado, caminhando para outro lugar, mais errado ainda. Almejava a asfixia, golfadas de vermelho quente.
Foi então que percebi que a dor não deve ser suportável ou fazer parte do cotidiano. Se dói, está incorreto, imperfeito, precisa ser descoberta a origem do mal e aniquilá-la. Minha idéia de força mudou: ser forte não é suportar a dor, é combatê-la.
Incrível como a dor física se assemelha às dores de espírito: estupidamente nos acostumamos com elas.

Pela janela do quarto branco via o amanhecer e o anoitecer, o despertar e o adormecer entre os arranha-céus. Os imponentes gigantes formavam um conveniente corredor que me possibilitava ver, ao longe, a Ponte Rio-Niterói. Lá, eu sabia, estava o mar. E o azul do dia era entrecortado por aviões que chegavam e partiam, como nós - em relação ao mundo e à vida. A origem e o destino, neste caso, são meros detalhes, e o importante é o intervalo entre os dois.
Há sete dias, quando lá cheguei, a música que tocava insistentemente dentro de mim era "O último dia". Confesso de peito aberto e sem medo de parecer ridícula que o pessimismo - aquele miserável - tomou-me de assalto no início. Mas agora, mesmo ainda enclausurada no quarto branco, olho o sol pela janela e sinto que ele brilha dentro e fora do cômodo; vejo os aviões e aceno; olho a ponte e, com um sorriso, sinto vontade de mergulhar na água do mar de Ilha Grande.
Hoje convenci-me de que meus sentidos se aguçaram e modificaram: haverá pores-do-sol mais radiantes e alaranjados do que nunca; haverá dias chuvosos mais aconchegantes; haverá o romance ideal me acompanhando até o fim.
Hoje estou livre.
Hoje começo a (re)viver.
Postado por Nina

3 comentários:

E agora José? disse...

E eu, posso sentir as areias da praia na pele, o cheiro de maresia, as estrelas acima e o calor queimando dentro e em volta de mim... Ai ai.

Esses sete dias foram difíceis para você, e saber disso sem poder ajudar mais do que tentar na corrida conversa de telefone fazer você esquecer que estava em um hospital. Lutar contra o pessimismo - esse miserável - a sua atenção e resgatar seu sorriso, refém da longa estadia, foi um desafio e tanto. Por isso estava disposto a qualquer loucura para te ver, eu daria tudo de mim para que esses dias fossem como o último que você registrou, sereno e pacífico. Porém, nada é inteiro desperdício. Essa reclusão forçada lhe deu o tempo que você precisava e sinto você mais segura e feliz. "Radiante", essa é a palavra que eu procurava quando tentei hoje te dizer o que eu via no seu rosto. Você realmente carrega o sol com você, e ele brilha nos seus olhos e ilumina seu rosto. Perco a noção do tempo quando te olho, posso tranqüilamente passar o resto da vida admirando seus olhos e mesmo assim, sei que vou me surpreender e suspirar repetindo: Linda, você é uma delícia. Porque você é linda e é uma delícia.

E agora José? disse...

Da próxima vez, foge comigo uma semana, que tal?

I'm Nina, Marie, etc... disse...

Pessimismo? Que bicho é esse?
Como você mesmo disse, "U.A." (rsrs), o sol está brilhando e eu, radiante...

Quanto a fugir, eu tenho uma boa idéia do lugar pra onde quero fugir... De preferência, ficar na cama o dia todo e abrir uma boa garrafa de vinho "A........o".