O tédio é um bicho que cheira à morte no juízo dos exagerados, nos arroubos vulcânicos, previsíveis e ardidos. O caos pelo lado de dentro da moldura na parede parece estranho e desconfortavelmente cômodo. É como a angústia lenta e infantil que espera as férias nos últimos e massacrantes dias letivos. Um sonhar lamacento, que vai te engolindo feito areia movediça quando se está a dois dedos de alcançar a borda, a margem, a salvação. Ao longe, um cheiro inventado de roupa lavada que secou ao sol, e uma imagem que remete à infância: as bacias das avós com as camisas quarando, anunciando uma brancura que doía nos olhos. E aquele cheiro, aquele cheiro de conforto, de amor, agora sobe e preenche os espaços deixados em branco, mas são novas memórias: memórias do futuro, do imprevisível, das apostas improváveis. O risco. A adrenalina e os suores. Unhas meticulosamente cortadas até a quase dor já não fazem diferença, pois estão sempre em carne viva. Cartas de outrora agora só existem nos lábios-envelopes (vermelhos ou crus), prontas para leitura em voz baixa, sussurrante. Da janela, uma estrada-mar, curvilínea e deliciosa, ora mansa, ora turbulenta feito infernos astrais, sacode o pó do tédio dos dias.
E assim morre mais um. E morre amavelmente, com o breu que chega na mansidão do silêncio negro que me beija as pálpebras.
(Rio de Janeiro, 8 de janeiro de 2022. Memórias da clausura. )
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