EGO
"Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes
que aqui caleidoscopicamente registro."
(Clarice Lispector)
sábado, 28 de fevereiro de 2009
sobre a memória doente...
quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009
sobre a presença do amor...
Não sinto mais a devastadora dor da partida. O corpo acostumou-se à dormência da espera, que se transforma a partir da sensação causada pela presença do outro corpo. Sinto como se meus fragmentos se dispersassem em porções ainda menores; partículas em ebulição se separam e chocam violentamente umas contra as outras e depois amornam e acalmam. E a ausência do outro é como a água que serena após a fervura, como a brandura das águas de um lago nos dias em que o vento não sopra.
quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009
sobre o medo, o horror e a raiva...
domingo, 15 de fevereiro de 2009
a razão dos meus sorrisos...
quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009
sobre a cegueira...
segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009
sobre a masturbação (parte II)...
domingo, 8 de fevereiro de 2009
o monge e a flor...
Tantalizada pela sensação da língua quente e macia entre as coxas, suspirava, quase em desespero. Nunca havia experimentado a sensação de uma boca plena e faminta na intimidade da alcova.
Sentia como se seu sexo fosse uma fruta, uma flor, e imaginava as nuvens correndo rápido pelo céu que não via. Imaginou o teto abobadado acima deles. Lembrou dos afrescos ali pintados. Sentiu-se culpada. Mas a impressão do sentido que aquela boca causava, o toque da barba, o cheiro que desprendia de seu sexo e impregnava toda a nave central a faziam esquecer de todo o pecado que pudesse estar cometendo.
Sentiu os dedos aliando-se à língua; sentiu algo penetrando a carne, rasgando o sexo que se abria e fechava, mastigando o que quer que lhe fosse oferecido. O corpo inteiro estremecia em pequenos espasmos, fazendo com que o sexo dele se armasse, endurecido contra os pequenos pés, gotejando a baba de delícias contidas durante tanto tempo.
As coxas se contraíam em torno do rosto, pressionando cada vez mais e empurrando o sexo de encontro à boca. A barba densa molhava-se a cada investida da língua que não descansava; gemidos reverberavam pelo amplo espaço que os cercava. As unhas de ambos cavavam a pele do outro, deixando marcas do amor que sentiam.
Aos poucos, enquanto ela empinava o quadril na direção dele, ele se despia, banhado em suor. Em pouco tempo, o hábito havia sido posto de lado. Gemiam e arfavam como dois animais selvagens, como se o mundo pudesse acabar no instante seguinte. Estavam famintos pelo outro.
A boca e a barba enfiados no vale entre as coxas abafavam os gemidos do jovem monge. A mulher emitia sons contidos e pedia perdão pelo delicioso pecado que seu amante mastigava no meio de suas pernas. O inferno havia se instaurado ali. Desejavam a morte, a pequena morte que era prometida aos amantes.
Ela mordeu os lábios, anunciando o ponto máximo do momento. E ele, ao sentir que sua respiração acelerava, investiu mais forte contra a flor aberta que tinha entre os dentes, na ponta da língua. Contraiu as coxas e suplicou para que ela não gozasse.
Com o sexo na mão, levantou-se. Ela chorava, implorando para que ele não parasse. Mas ele queria mais. Já havia pecado e não pararia até conseguir alcançar o máximo que pudesse daquele momento.
Olhou a mulher e fez movimentos rápidos com a mão que tocava o próprio sexo, enquanto a outra alisava a virilha. Olhou os seios e gemeu. Olhou as coxas, as nádegas, o sexo. Como era bonito o sexo aberto como uma flor. Como brilhava, molhado de desejo. O sangue parecia acumular-se num único ponto de seu corpo, e notou como ficava vermelho e lustroso à medida que a fricção aumentava.
Ela, deitada, suplicava. Pedia que ele estivesse nela, do jeito que fosse - língua, dedos, sexo. Abriu-se e com a ponta do dedo tocou o ponto protuberante que guardava seu prazer. Chorou. Desejava que ele fizesse seu corpo ter os espasmos que ela tanto desejava. Ajoelhou-se e pediu. Pôs-se de quatro e ofereceu o que ele quisesse tomar.
Sem hesitar, o jovem padre colocou-se de joelhos atrás dela e a invadiu lentamente, sentindo cada centímetro pulsar na penetração. Fez questão de rasgá-la, indo e vindo com força, soluçando, colocando o terço apoiado em suas costas.
Ela chorava, empinando-se cada vez mais forte na direção dele. Sentia o ventre arder e o sexo dele inchar dentro de seu corpo.
E foi então que a venda dos olhos foi retirada. O jovem ergueu-se mais uma vez e colocou-se diante da mulher. De joelhos à sua frente, os lábios vermelhos dos beijos que haviam trocado o receberam devotamente. Os olhos reviraram e o sangue pulsou mais rápido nas veias. Segurou a mulher pelos cabelos que caíam pelos ombros dourados e pronunciou uma oração em latim, ora arfando, ora engolindo as palavras que saíam desordenadamente. E quando sentiu sua alma querer desprender-se do corpo, afastou-se da boca que o adorava e deixou jorrar o amor espumante no rosto delicado. E quando ela ergueu os olhos em sua direção, clemente, ele desenhou em sua testa e em sua boca o sinal da cruz, abençoando os lábios sublimes que guardavam o mistério divino.
Foram felizes. Sujos e felizes. Proibidamente felizes. Mataram o pecado e a culpa com o amor carnal.
sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009
feito lobos e gatos...
quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009
sobre a falta de razão...
Esse cientificismo exagerado rouba a harmonia das coisas. Nem sempre há uma explicação lógica para eventos.
Lagartas tornam-se borboletas depois de um período dentro do casulo. Passam de insetos sem atrativos a criaturas sedutoras e coloridas. E a explicação mais atraente para tal evento é a menos racional, a improvável, a mais romântica.
Nós, os doces bárbaros, gostamos da falta de explicação, da ausência de razão, da beleza dos escafandristas marcianos que buscam no fundo dos rios as venusianas ideais.
segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009
repostando...
(Tom Jobim / Vinicius de Moraes)
Eu sei e você sabe,
já que a vida quis assim
Que nada nesse mundo
levará você de mim
Eu sei e você sabe
que a distância não existe
Que todo grande amor
Só é bem grande se for triste
Por isso, meu amor
Não tenha medo de sofrer
Que todos os caminhos
me encaminham pra você
Assim como o oceano
Só é belo com luar
Assim como a canção
Só tem razão se se cantar
Assim como uma nuvem
Só acontece se chover
Assim como o poeta
Só é grande se sofrer
Assim como viver
Sem ter amor não é viver
Não há você sem mim
E eu não existo sem você
sobre os demônios...
domingo, 1 de fevereiro de 2009
sobre a trilogia essencial...
Virgine: carta ao psicanalista
Descobri-me diferente ainda muito jovem. Perguntava-me diante do espelho o que era aquele grande segredo que tinha certeza que guardava dentro de mim. Sentia que alguma memória perturbadora me acompanhava, algo que havia trancado dentro de meu calabouço pessoal.
As noites pareciam infindáveis punições, pois os sonhos me atordoavam incessantemente. Porém, quando despertava, as recordações fugiam novamente para o calabouço. Mas a sensação daquele grito contido dentro da garganta me sufocava cada vez mais. E a falta de ar era por vezes tão desesperadora que quase podia sentir os pulmões explodindo. Aquilo precisava sair; eu precisava respirar. E os dias passavam com imagens e lugares que eu já havia visto antes.
Outra noite. Outro sonho. Lençóis novamente encharcados ao meu redor. O ar era denso e pesado. Precisei sair do quarto. Mas a fobia não cessava. Precisei sair da casa.
A grama úmida do jardim parecia tão suave ao toque dos meus pés que, tão logo pude senti-la, uma lufada de ar fresco lambeu meu rosto e invadiu meus pulmões. Aliviada, deitei na grama e olhei o céu escuro salpicado de estrelas. Como era tudo tão imenso... e como eu me sentia livre fora daquele quarto escuro e sem ar.
Recordei-me de quando tinha 5 anos e passeava de mãos dadas com papai nos domingos ensolarados. Os parques pareciam tão enormes e eu corria pela grama com os braços abertos, ziguezagueando entre as árvores das vastas aléias. Ele vinha correndo logo atrás, me deixando ganhar, fingindo que eu era muito mais rápida que ele. E quando chegávamos à outra extremidade, ele se jogava no chão e dizia que estava acabado, completando: "Você é uma lagartinha mutante, Virgine! Vai se tornar uma maravilhosa borboleta e voar, voar, voar..." É a última recordação que tenho de minha infância. E de meu pai.
Depois disso, só me lembro da adolescência, de ter vivido com meus avós numa cidadela de poucos habitantes e de ter ido para a capital francesa para cursar a universidade. Desde então vivo só. Porque quando estou comigo, não me sinto solitária; é uma mistura de paz e doce melancolia, um estado de quietude de alma.
Quando estou sozinha mergulho em mim, porque preciso lembrar quem eu sou, preciso conhecer a Virgine que fui. Preciso abrir o calabouço e descobrir meu próprio segredo. Preciso enfrentar meus próprios demônios. Por isso estou aqui hoje.