domingo, 31 de janeiro de 2010

sobre o casamento (de novo)

Antes de mais nada, vale esclarecer: não faço apologia contra o casamento. Também não sou nenhuma feminista-xiita-tresloucada e nem queimei sutiã na pracinha. Apesar de toda a minha independência e liberdade, ainda curto o cavalheirismo, o romantismo etc. Sou cafona quando amo, beirando o ridículo mesmo. Mas quem não o é?

O que me incomoda em relação ao casamento é a institucionalização dos sentimentos (vejam bem, SENTIMENTOS, no plural mesmo). Incomoda a pergunta que se faz quando se resolve casar. 
- Papai, mamãe... eu e Jorjão vamos casar.
- Que ótimo, filha. Então nos diga, por que vocês decidiram isso agora?
- Porque nos amamos...

Esse é o momento em que rola um silêncio mortal e entreolhares suspeitos de Dona Candinha e Seu Vitório. Mas Marcinha não está nem aí, só tem olhos para o Jorjão. Na cabecinha dela o casamento resume-se em uma eterna lua-de-mel, sexo maravilhoso todos os dias e declarações de amor ad aeternum. Dona Candinha tenta explicar para a filha que esse é um passo muito importante, que é preciso tomá-lo com muita firmeza para que não haja arrependimento. Mas o que Dona Candinha esquece de dizer é que é preciso fazer as perguntas certas: estou preparada(o) para viver com o(a) outro(a)? saberei ceder quando for necessário? conseguirei conviver com as diferenças, com a rotina, com os defeitos do(a) outro(a)? conseguiremos dormir juntos quando a mágoa for instaurada por banalidades? continuaremos nos respeitando mesmo discordando o tempo todo e sendo tão diferentes? saberei ser cúmplice e acalentar o outro mesmo quando acreditar que ele(a) está totalmente errado? entenderei o seu silêncio e o seu cansaço? amarei apesar de tudo?
 
Apesar de tudo. É esse o ponto crucial. Amar pura e simplesmente é a parte fácil. Mas só o amor não sustenta relacionamento algum. Há quem ame loucamente e simplesmente não consiga conviver com o outro. Há quem viva junto a vida inteira e não ame tão loucamente assim. O casamento é um bolo sem receita padrão - precisa de vários ingredientes para ser preparado, mas cada um tem o seu gosto e sua receita particular. Há os de chocolate, há os de laranja, há os de aipim. Mas uma coisa é certa: é preciso juntar todos os ingredientes (sejam eles quais forem - uns mais do que outros) para fazer o bolo crescer, parecer realmente um bolo. Mas Dona Candinha não explica isso. Até sugere que façam antes um test drive, um estágio de 6 meses vivendo juntos antes de tomar qualquer decisão. Mas Marcinha é irredutível. Está certa do que quer. Ama o Jorjão. Então Dona Candinha apenas torce para que tudo dê certo. E para que a filha seja feliz.
Casam-se. Uma semana depois, Marcinha volta à sua mãe dizendo que não aguenta os roncos do marido. E que ele tem o péssimo hábito de deixar as roupas sujas pelo avesso no banheiro. E que ele fuma enquanto faz palavras cruzadas no trono toda manhã. E que não puxa a descarga direito depois disso, deixando vestígios das refeições anteriores caso o pessoal do CSI precisasse investigá-lo. O que antes só presenciava quando iam ao motel (e que até achava bonitinho) agora a irritava.
 
- O nome disso é casamento - retruca Dona Candinha, sem levantar os olhos do bordado.
- Por que você não me avisou?, pergunta Marcinha.
Dona Candinha levanta os olhos e encara a filha por cima dos óculos. Olham-se por 7 segundos e a mãe volta ao bordado. E aquele "mas eu te avisei" implícito instaura um silêncio constrangedor. Fim de papo.
Marcinha volta para o seu ninho de amor (mais para ninho do que para amor) e prepara o melhor jantar do mundo. Separa aquela camisolinha vermelha que o Jorjão só faltava rasgar quando eram namorados, tamanho tesão sentia por ela quando podiam ter a intimidade sexual "proibida" aos não casados. Faz uma escova no cabelo. Pinta-se. Perfuma-se. Jorjão chega e a surpreende na cozinha, terminando de colocar a mesa, já vestida para seduzir. Beija-lhe a testa (a testa!). Solta um "hmmm" longo e sonoro. Marcinha sente que a noite promete. 
- Que cheiro delicioso!
Marcinha está prestes a dizer que era um perfume a base de especiarias quando Jorjão complementa, levantando a tampa da panela:
- Oba! Parece estar boa essa carninha aí que você fez, hein! Tem feijão?
E Marcinha corre para o quarto e se joga na cama, debulhando-se em lágrimas.
Suspense. Pânico. "O que diabos eu fiz agora?", pensa Jorjão. "Ih, deve ser TPM. Melhor deixar ela quieta." E Jorjão deixa Marcinha chorar, não por ser um crápula sem coração ou por não amá-la. Mas porque acredita que é o melhor a fazer naquele instante. Marcinha e Jorjão não entendem que não há mais o jogo de mistério de antes. Não entendem que optaram por dividir tudo - cama, banheiro, contas - e que isso implicaria em também dizer tudo o tempo todo. Marcinha não quer ser apenas esposa, mãe, companheira. Quer ser mulher, mesmo depois dos filhos, dos quilos extra e da crueldade do tempo (e da gravidade). Por sua vez, Jorjão não deseja ser apenas o homem da casa, o pai, o marido. Também precisa ser o homem que faz os olhos de Marcinha brilharem. Precisa ser amado, seduzido, escutado. Mesmo quando não tiver mais a disposição dos vinte e poucos anos. Mesmo quando o sexo começar a falhar. Jorjão e Marcinha precisam ser mais que amantes agora: precisam ser melhores amigos. Confidentes. E esse é o grande problema. Não estavam preparados para isso.
Não prolongando muito mais a conversa, acredito que o grande drama do casamento - além da pergunta errada - seja aquele bendito papel. Você casa com a ideia de ser feliz para sempre. Aliás, casa-se com a obrigação de ser feliz para sempre. Preocupa-se tanto com o futuro que se esquece de realizar as pequenas coisas do presente. Esquece de saber ser feliz a cada dia, um por um, como se fosse o último. E isso não exige irresponsabilidade ou exageros. Exige saber ser feliz com as pequenas coisas. Com suas próprias escolhas. Sem arrependimentos. Apenas ser feliz. Apesar de tudo.

3 comentários:

  1. Concordo sobre o casamento e espero que nós consigamos ser mais felizes do que Jorjão e Marcinha. Que possamos sempre fazer as perguntas certas e que possamos responder sinceramente, todas elas. Eu te amo, estou cansado, mas não posso descansar. Tive um final de semana corrido e apesar do cansaço, foi muito bom. Mas queria ter você comigo, quero você pra sempre. Porque te amo, porque quero você inteira, porque aceito o desafio de bom grado.

    No matter how far. Close, inside, baby.

    Would you like do marry me?

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  2. Saudades de ler vc.
    (Sim, só voltei a ler seu blog agora, mas li uma porrada de posts de uma vez).
    Te amo sempre, sis.

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  3. Zé,

    Eu acabei de perceber que não havia te respondido... Yes, i would love to... I know we can do it...

    Pri,

    Também sinto sua falta. E vc vai ser nossa madrinha, tá?

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